DECLARAÇÃO E PROGRAMA DE AÇÃO DE VIENA (1993)* A. Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, Considerando que a promoção e proteção dos direitos humanos são questões prioritárias para a comunidade internacional e que a Conferência oferece uma oportunidade singular para uma análise abrangente do sistema internacional dos direitos humanos e dos mecanismos de proteção dos direitos humanos, para fortalecer e promover uma maior observância desses direitos de forma justa e equilibrada, Reconhecendo e afirmando que todos os direitos humanos têm origem na dignidade e valor inerente à pessoa humana, e que esta é o sujeito central dos direitos humanos e liberdades fundamentais, razão pela qual deve ser a principal beneficiária desses direitos e liberdades e participar ativamente de sua realização, Reafirmando sua adesão aos propósitos e princípios enunciados na Carta das Nações Unidas e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, Reafirmando o compromisso assumido no âmbito do artigo 56 da Carta das Nações Unidas de tomar medidas conjuntas e separadas, enfatizando adequadamente o desenvolvimento de uma cooperação internacional eficaz, visando à realização dos propósitos estabelecidos no artigo 55, incluindo o respeito universal e observância dos direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas, Enfatizando as responsabilidades de todos os Estados, em conformidade com a Carta das Nações Unidas, de desenvolver e estimular o respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas sem distinção de raça, sexo, idioma ou religião, Lembrando o Preâmbulo da Carta das Nações Unidas, particularmente a determinação de reafirmar a fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e valor da pessoa humana e nos direitos iguais de homens e mulheres de nações grandes e pequenas, Lembrando também a determinação contida no Preâmbulo da Carta das Nações Unidas de preservar as gerações futuras do flagelo da guerra, de estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações emanadas de tratados e outras fontes do direito internacional possam ser mantidos, de promover o progresso social e o melhor padrão de vida dentro de um conceito mais amplo de liberdade, de praticar a tolerância e a boa vizinhança e de empregar mecanismos internacionais para promover avanços econômicos e sociais em benefício de todos os povos, Ressaltando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que constitui uma meta comum para todos os povos e todas as nações, é fonte de inspiração e tem sido a base utilizada pelas Nações Unidas na definição das normas previstas nos instrumentos internacionais de direitos humanos existentes, particularmente no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Considerando as importantes mudanças em curso no cenário internacional e as aspirações de todos os povos por uma ordem internacional baseada nos princípios consagrados na Carta das Nações Unidas, incluindo a promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas e o respeito pelo princípio dos direitos iguais e autodeterminação dos povos em condições de paz, democracia, justiça, igualdade, Estados de Direito, pluralismo, desenvolvimento, melhores padrões de vida e solidariedade, Profundamente preocupada com as diversas formas de discriminação e violência às quais as mulheres continuam expostas em todo o mundo, Reconhecendo que as atividades das Nações Unidas na esfera dos direitos humanos devem ser racionalizadas e melhoradas, visando a fortalecer o mecanismo das Nações Unidas nessa esfera e promover os objetivos de respeito universal e observância das normas internacionais dos direitos humanos, Tendo levado em consideração as Declarações aprovadas nas três Reuniões Regionais realizadas em Túnis, San José e Bangkok e as contribuições dos Governos, bem como as sugestões apresentadas por organizações intergovernamentais e não-governamentais e os estudos desenvolvidos por peritos independentes durante o processo preparatório da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, Acolhendo o Ano Internacional dos Povos Indígenas de 1993 como uma reafirmação do compromisso da comunidade internacional de garantir-lhes todos os direitos humanos e liberdades fundamentais e respeitar suas culturas e identidades, Reconhecendo também que a comunidade internacional deve conceber formas e meios para eliminar os obstáculos existentes e superar desafios à plena realização de todos os direitos humanos e para evitar que continuem ocorrendo casos de violações de direitos humanos em todo o mundo, Imbuída do espírito de nossa era e da realidade de nosso tempo, que exigem de todos os povos do mundo e todos os Estados Membros das Nações Unidas empreendam com redobrado esforço a tarefa de promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, de modo a garantir a realização plena e universal desses direitos, Determinada a tomar novas medidas em relação ao compromisso da comunidade internacional de promover avanços substanciais na área dos direitos humanos mediante esforços renovados e continuados de cooperação e solidariedade internacionais, Adota solenemente a Declaração e o Programa de Ação de Viena
I 1. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma o compromisso solene de todos os Estados de promover o respeito universal e a observância e proteção de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas, em conformidade com Carta das Nações Unidas, outros instrumentos relacionados aos direitos humanos e o direito internacional. A natureza universal desses direitos e liberdades está fora de questão. Nesse contexto, o fortalecimento da cooperação internacional na área dos direitos humanos é essencial à plena realização dos propósitos das Nações Unidas. Os direitos humanos e as liberdades fundamentais são direitos naturais de todos os seres humanos; sua proteção e promoção são responsabilidades primordiais dos Governos. 2. Todos os povos têm direito à autodeterminação. Em virtude desse direito, determinam livremente sua condição política e promovem livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. Levando em consideração a situação particular dos povos submetidos à dominação colonial ou outras formas de dominação estrangeira, a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reconhece o direito dos povos de tomar medidas legítimas, em conformidade com a Carta das Nações Unidas, para garantir seu direito inalienável à autodeterminação. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos considera que a negação do direito à autodeterminação constitui uma violação dos direitos humanos e enfatiza a importância da efetiva realização desse direito. De acordo com a Declaração sobre os Princípios do Direito Internacional Relativos à Relações Amistosas e à Cooperação entre Estados em conformidade com a Carta das Nações Unidas, nada do que foi exposto acima será entendido como uma autorização ou estímulo à qualquer ação que possa desmembrar ou prejudicar, total ou parcialmente, a integridade territorial ou unidade política de Estados soberanos e independentes que se conduzam de acordo com o princípio de igualdade de direitos e autodeterminação dos povos e que possuam assim Governo representativo do povo como um todo, pertencente ao território sem qualquer tipo de distinção. 3. Devem ser adotadas medidas internacionais eficazes para garantir e monitorar a aplicação de normas de direitos humanos a povos submetidos a ocupação estrangeira, bem como medidas jurídicas eficazes contra a violação de seus direitos humanos, de acordo com as normas dos direitos humanos e o direito internacional, particularmente a Convenção de Genebra sobre Proteção de Civis em Tempo de Guerra, de 14 de agosto de 1949, e outras normas aplicáveis do direito humanitário. 4. A promoção e proteção de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais devem ser consideradas como um objetivo prioritário da Nações Unidas, em conformidade com seus propósitos e princípios, particularmente o propósito da cooperação internacional. No contexto desses propósitos e princípios, a promoção e proteção de todos os direitos humanos constituem uma preocupação legítima da comunidade internacional. Os órgãos e agências especializados relacionados com os direitos humanos devem, portanto, reforçar a coordenação de suas atividades com base na aplicação coerente e objetiva dos instrumentos internacionais de direitos humanos. 5. Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global, justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase. Embora particularidades nacionais e regionais devam ser levadas em consideração, assim como diversos contextos históricos, culturais e religiosos, é dever dos Estados promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, sejam quais forem seus sistemas políticos, econômicos e culturais. 6. Os esforços do sistema das Nações Unidas para garantir o respeito universal e a observância de todos direitos humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas contribuem para a estabilidade e bem-estar necessários à existência de relações pacíficas e amistosas entre as nações e para melhorar as condições de paz e segurança e o desenvolvimento social e econômico, em conformidade com a Carta das Nações Unidas. 7. O processo de promoção e proteção dos direitos humanos deve ser desenvolvido em conformidade com os propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas e o direito internacional. 8. A democracia, o desenvolvimento e o respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais são conceitos interdependentes que se reforçam mutuamente. A democracia se baseia na vontade livremente expressa pelo povo de determinar seus próprios sistemas políticos, econômicos, sociais e culturais e em sua plena participação em todos os aspectos de suas vidas. Nesse contexto, a promoção e proteção dos direitos humanos e liberdades fundamentais, em níveis nacional e internacional, devem ser universais e incondicionais. A comunidade internacional deve apoiar o fortalecimento e a promoção de democracia e o desenvolvimento e respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais no mundo inteiro. 9. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma que os países menos desenvolvidos que optaram pelo processo de democratização e reformas econômicas, muitos dos quais situam-se na África, devem ter o apoio da comunidade internacional em sua transição para a democracia e o desenvolvimento econômico. 10. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma o direito ao desenvolvimento, previsto na Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento, como um direito universal e inalienável e parte integral dos direitos humanos fundamentais. Como afirma a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, a pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento. Embora o desenvolvimento facilite a realização de todos os direitos humanos, a falta de desenvolvimento não poderá ser invocada como justificativa para se limitar os direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Os Estados devem cooperar uns com os outros para garantir o desenvolvimento e eliminar obstáculos ao mesmo. A comunidade internacional deve promover uma cooperação internacional eficaz visando à realização do direito ao desenvolvimento e à eliminação de obstáculos ao desenvolvimento. O progresso duradouro necessário à realização do direito ao desenvolvimento exige políticas eficazes de desenvolvimento em nível nacional, bem como relações econômicas eqüitativas e um ambiente econômico favorável em nível internacional. 11. O direito ao desenvolvimento deve ser realizado de modo a satisfazer eqüitativamente as necessidades ambientais e de desenvolvimento de gerações presentes e futuras. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reconhece que a prática de descarregar ilicitamente substâncias e resíduos tóxicos e perigosos constitui uma grave ameaça em potencial aos direitos de todos à vida e à saúde. Consequentemente, a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos apela a todos os Estados para que adotem e implementem vigorosamente as convenções existentes sobre o descarregamento de produtos e resíduos tóxicos e perigosos e para que cooperem na prevenção do descarregamento ilícito. Todas as pessoas têm o direito de desfrutar dos benefícios do progresso científico e de suas aplicações. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos observa que determinados avanços, principalmente na área das ciências biomédicas e biológicas, podem ter conseqüências potencialmente adversas para a integridade, dignidade e os direitos humanos do indivíduo e solicita a cooperação internacional para que se garanta pleno respeito aos direitos humanos e à dignidade nessa área de interesse universal. 12. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos apela à comunidade internacional no sentido de que a mesma empreenda todos os esforços necessários para ajudar a aliviar a carga da dívida externa dos países em desenvolvimento, visando complementar os esforços dos Governos desses países para garantir plenamente os direitos econômicos, sociais e culturais de seus povos. 13. Os Estados e as organizações internacionais, em regime de cooperação com as organizações não-governamentais, devem criar condições favoráveis nos níveis nacional, regional e internacional para garantir o pleno e efetivo exercício dos direitos humanos. Os Estados devem eliminar todas as violações de direitos humanos e suas causas, bem como os obstáculos à realização desses direitos. 14. A existência de situações generalizadas de extrema pobreza inibe o pleno e efetivo exercício dos direitos humanos; a comunidade internacional deve continuar atribuindo alta prioridade a medidas destinadas a aliviar e finalmente eliminar situações dessa natureza. 15. O respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais, sem distinções de qualquer espécie, é uma norma fundamental do direito internacional na área dos direitos humanos. A eliminação rápida e abrangente de todas as formas de racismo e discriminação racial, de xenofobia e de intolerância associadas a esses comportamentos deve ser uma tarefa prioritária para a comunidade internacional. Os Governos devem tomar medidas eficazes para preveni-las e combate-las. |