TESE 22                                                                                                               4ª COMISSÃO


INDENIZAÇÃO E REPOSIÇÃO AO ERÁRIO POR DÍVIDA DE SERVIDOR ESTADUAL.

LIMITES CONSTITUCIONAIS E LEGAIS AO DESCONTO

EM FOLHA DE PAGAMENTO

 

José Paulo Soriano de Souza

Procurador do Estado da Bahia

 

SUMÁRIO. I. Introdução. II. Natureza jurídica dos créditos radicados no pagamento indevido e na indenização por ato ilícito. III Da incompensabilidade dos vencimentos. IV Limites Constitucionais e infraconstitucionais ao desconto em folha de pagamento, para ressarcimento e reposição ao erário estadual. V. Conclusões.

 

I.INTRODUÇÃO

Ensina Tornaghi (1) - um de nossos maiores juristas - que o poder jurídico (direito potestativo) consiste na possibilidade que o Direito objetivo assegura a alguém de submeter outrem à sua vontade. Ao direito potestativo não corresponde uma necessidade imposta, a alguém, pela lei, de fazer (ou omitir) certa prestação. Ao poder jurídico se correlaciona, sim, e tão-somente, a sujeição de outrem. Quem titulariza esse poder não tem o direito de exigir que o outro lhe preste alguma coisa; ele mesmo pode fazê-lo à custa do outro, que não tem como livrar-se de tal situação. Daí o estado de sujeição, que se caracteriza pela subordinação inelutável a uma modificação da esfera jurídica de alguém, por ato de outrem (2). Neste estado, em que não há dever de conduta, a pessoa, mesmo contra a sua vontade, sujeita-se a que sua esfera jurídica seja constituída, modificada ou extinta pelo titular do direito potestativo.

Mas sequer a potesta, sequer o status subjectionis, estão ao alcance de quem quer que seja, sponte propria. É de mister que o Direito objetivo os possibilite.

Daí algumas indagações.

Pode o legislador estadual conferir, à Administração, o poder de proceder, direta e unilateralmente, ao desconto em folha de pagamento, para o fim de reposição ou indenização do Erário? Ou, sob o outro ângulo da questão: pode o mesmo legislador submeter o servidor, inelutavelmente, ao poder jurídico da Administração, para que tenha parcela de seu crédito retida, e mensalmente sacrificada, até a exaustão da totalidade de seu débito para com o Estado? Em síntese: faculta-se ao legislador e estadual munir a Administração do direito potestativo de lançar mão dos vencimentos do servidor – indiferentemente e até mesmo contra a vontade deste -, para fins de compensação de dívida, quando a origem do débito remonta a ato ilícito ou a pagamento indevido, mediante a retenção do crédito em folha?

A preocupação procede.

Com efeito, consoante alhures afirmamos (3), é comum que as entidades federadas tomem o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União como fonte de inspiração para elaboração de seus diplomas congêneres. Com grande freqüência, essas entidades perfilham o molde talhado pelo legislador federal, adotando-lhe o arcabouço e a estrutura, assimilando-lhe a sistematização, reproduzindo-lhe institutos, acolhendo a solução de lei para dirimência de temas doutrinariamente controversos. Advertimos, porém, que, se os Estados logram por fonte de inspiração a lei estatutária da União, porque nela vêem uma âncora segura, fundeada pela experiência dos legisladores federais, devem acautelar-se. Aqui e ali pontilham armadilhas, criadas pela competência reservada, ou pela inadequação da regra trasladada aos princípios gerais de direito. A transfusão da matéria legal da União para as ordens locais há de se pautar, de fato, na prudência. A assimilação nem sempre depura as regras de competência privativa da União. Como resultado, positivam-se regras inconstitucionais que, pela invasão da competência legiferante, soem constituir rica fonte para a prática de atos ilegítimos. De sua feita, não se expurgam regras inconciliáveis com os princípios gerais de direito. Ao reproduzi-la, o legislador Estadual repete as mesmas incongruências e ilogicidades da norma matriz, muitas vezes comprometidas "ex radice" em sua eficácia e aplicabilidade.

Ora, ninguém será obrigado a fazer, deixar de fazer – ou mesmo sujeita-se - senão em virtude de lei. E de lei promanada pela entidade federada competente para editá-la. Ademais, a remuneração – que já ninguém mais duvida tenha caráter alimentar - é direito assegurado em sede constitucional ao servidor, resguardado, aliás, do alvedrio do Administrador quanto à redutibilidade de seu conteúdo econômico. Enfim, sendo o crédito constituído pelo desempenho de uma atividade verdadeiro bem jurídico, dele ninguém poderá ser privado sem o devido processo legal.

Dessarte, em face do que dispõem os arts. 5º , II e LIV; 22, I e 39, § 2º c/c art. 7º, VI, da Constituição Federal, repergunta-se: Pode o legislador estadual conceder, à Administração, a prerrogativa de proceder, direta e unilateralmente, à compensação de dívida oponível ao servidor, independentemente da anuência deste, para indenizar-se ou restituir-se, mediante desconto da remuneração devida?

É isto a que nos propusemos responder.

 

II. NATUREZA CIVIL DOS CRÉDITOS RADICADOS NO PAGAMENTO INDEVIDO E NA INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO

Os art. 45 e 48 do Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, a pretexto de garantir a irredutibilidade e intangibilidade dos estipêndios dos servidores, indicam que a remuneração ou os proventos não serão objeto de desconto além do que for imposto por lei (v.g., imposto de renda retido na fonte, contribuições previdenciárias) ou por mandado judicial, não podendo, ademais, ser objeto de arresto, seqüestro ou penhora. Contudo, no artigo subseqüente, rende ensejo a uma peculiar (e injustificável, sob o ângulo estritamente científico, como se verá) exceção, g.n.:

"Art. 47 - As reposições e indenizações ao erário serão descontadas em parcelas mensais não excedentes à décima parte da remuneração ou proventos, em valores atualizados".

 

A lei impõe, assim, à Administração Federal, o inarredável poder-dever (a lei fala "serão", o que denota um imperativo indeclinável) de operar, de "per si", unilateral, direta e sumariamente, independentemente da autorização do servidor, ou de vênia judicial, a compensação parcelada da dívida, quando a origem do débito radica-se em ato ilícito (indenização) e pagamento indevido (reposição (4)).

Hely, em seu clássico compêndio (5), e quando ainda em vigor o Estatuto federal revogado, que trazia regra quase idêntica ao dispositivo supratranscrito, já pontificava que os estatutos costumavam admitir, especialmente em caso de indenização, o desconto em folha.

Seguindo a trilha da nova lei federal, porém mais voraz, o Estatuto baiano (6) dispõe:

"Art. 57. Salvo por imposição legal ou por mandado judicial, nenhum desconto incidirá sobre a remuneração ou proventos.

 

...................OMISSIS.................

 

"Art. 58. As reposições e indenizações ao erário serão descontadas em parcelas mensais, atualizadas, não excedentes à terça parte da remuneração ou dos proventos."

 

Esqueceu o legislador baiano – assim como o fizeram os demais estatutos que trilharam, no particular, a senda aberta pela Lei Estatutária da União – que a repetição do indébito e a indenização por ato ilícito são institutos sistematizados pelo Direito Civil e, se não exclusivos desse ramo do Direito, aqui se nos exibem em sua primeva pureza, compondo matéria afeta à competência privativa da União.

Eduardo García Máyñez (7) expõe, em sua monumental Introdução, que, dentre as teorias que buscam estabelecer critérios distintivos entre o Direitos Público e o Direito Privado, a geralmente mais aceita é a que se funda na natureza das relações que as normas daqueles direitos estabelecem. E esclarece, com a sua peculiar clareza:

"Una relación es de coordinación cuando los sujetos que en ella figuran encuéntranse colocados en un plano de igualdad, como ocurre, verbigracia, si dos particulares celebran un contrato de mutuo o de comparaventa. Los preceptos del derecho dan origen a relaciones de subordindación, cuando, por el contrario, las personas a quienes se aplican no están consideradas como jurídicamente iguales, es dicer, cuando en la relación intervienen el Estado, en su carácter de entidad soberana, y un particular. Las relaciones de coordinación o igualdad no sólo pueden existir entre particulares, sino entre dos órganos del Estado, o entre un particular y el Estado, cuando el último no interviene en su carácter de poder soberano. La relación es de derecho privado, si los sujetos de la misma encuéntranse colocados por la norma en un plano de igualdad y ninguno de ellos interviene como entidad soberana. Es de derecho público, si se establece entre un particular y el Estado (quando hay subordinación del primero al segundo) o si los sujetos de la misma son dos órganos del poder público o dos Estados soberanos.

(....)

 

El Estado puede entrar, por conseguiente, tanto en relaciones de coordinación como de supraordinación com los particulares. El problema reducese, pues, a determinar cuál es el caráter com que figura en la relación jurídica".

 

Mas, indaga o professor mexicano, existe um critério firme para determinar tal caráter? Quando o Estado deve ser considerado como entidade soberana, e quando se encontra num plano de igualdade com os particulares?

Roguin, acresce García Máyñez, tratou de resolver a questão dizendo que a qualidade com que o Estado intervém na relação jurídica pode ser determinada examinando-se se a atividade estatal encontra-se sujeita a uma legislação especial ou às leis comuns. Existente uma legislação especial, estabelecida com o propósito de regular a relação, esta será de Direito Público. Se, ao contrário, a entidade pública se submete à legislação ordinária (por exemplo, quando o Estado compra a um particular determinado imóvel, de acordo com as normas do direito comum), a relação será de índole privada.

Ora, não é missão de qualquer lei, de natureza administrativa, deitar regra especial, derrogatória do direito comum, para estruturar e normatizar, com as peculiaridades do regime de direito público, a repetição de indébito, quando a credora é a Administração. Não há, aqui, princípios de ordem pública, na tutela da Administração (8), ou dos administrados, a justificar a existência de uma legislação especial. Não sobrejaz qualquer interesse coletivo a ser defendido ou sobreguardado (9). De sua feita, os próprios estatutos comumente realçam a distinção que se estabelece entre a responsabilidade civil e a responsabilidade administrativa, e neste mister em nada acrescentam ou extrapolam o direito comum, especialmente quando declaram que aquela decorre de ato comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo do erário ou de terceiro (Estatuto federal, art. 122; baiano, 182).

A verdade é que a obrigação de indenizar ou repetir em nada se deixa permear pelo influxo potestativo que, quase sempre, como um halo, acompanha a entidade federada, em suas múltiplas manifestações. Porém, prerrogativa de poder alguma coroa a Administração quando esta polariza relação jurídica que tem por fundamento o enriquecimento sem causa ou a prática do ato ilícito. A obrigação das partes deitam raízes no Direito comum e se erige a partir das normas positivadas nos arts.159 e 964 (10) do Código Civil. A condição de Estado e de servidor é meramente acidental e em nada qualifica a relação jurídica. Estado e servidor relacionam-se por vínculo de coordenação e se fixam, aqui, no mesmo plano de igualdade. A relação, conquanto dela participe o ente público, é de índole privada. Entre Administração e servidor erige-se nexo jurídico que, conquanto remota e acidentalmente relacionado ao vínculo estatutário, tem natureza civil, regido que é pelo direito comum.

 

III. DA INCOMPENSABILIDADE DOS VENCIMENTOS

De sua feita, conquanto transite em outros campos do Direito, também a compensação tem no direito comum a sua sede natural.

Ora, dispõe o inciso II, do art. 1.055, do Código Civil, que não são passíveis de compensação os valores impenhoráveis (11).

Cabem, aqui, algumas rápidas e perfunctórias considerações acerca da compensação de dívidas.

A compensação é o modo de extinção das obrigações em que, sendo as partes reciprocamente devedoras, as quantidades devidas, líquidas e exigíveis, se aniquilam, mutuamente, até onde concorrerem.

Trata-se de uma modalidade de pagamento forçado. Explica Cunha Gonçalves que a compensação acarreta "a extinção de duas obrigações recíprocas ou existentes em sentido inverso entre as mesmas pessoas, obrigações que se reputam pagas, seja totalmente, se forem iguais, seja até a concorrência da menor, se forem desiguais. Cada credor, portanto, paga-se retendo em seu poder o seu próprio débito. Há assim, nesta instituição, ao mesmo tempo, uma garantia, uma preferência e dois pagamentos simultâneos, sem que nenhum dos devedores tenha que fazer qualquer desembolso" (12) (g.n.).

Ao passo em que a lei civil toma por insusceptíveis de compensação os valores impenhroráveis, o Código de Processo Civil (art. 649, IV) (13) declara impenhoráveis os vencimentos dos servidores públicos.

A incompensabilidade das dívidas que recaem sobre bens ou valores impenhoráveis decorre de razões de ordem lógica. Só há lugar para a compensação quando acode a possibilidade de pagamento obrigatório. Isto, porém, não se verifica, consoante esclarece Dimas Rodrigues de Almeida (14), desde que caiba a impenhorabilidade, porquanto esta é impediente do meio legal de se tornar efetiva a obrigatoriedade. Se a compensação – já ensinava, anteriormente, Carvalho Santos (15) - é um pagamento obrigatório, não é possível ter aplicação onde o pagamento obrigatório não seja permitido. Vale o mesmo que dizer: "onde não for possível a penhora, que é o meio legal de tornar efetivo o pagamento, não é possível a compensação".

E acrescenta o mestre potiguar, com apoio em Soriano Neto:

"Em regra, todos os bens são penhoráveis. As exceções consignadas em lei fundam-se em relevantes razões de ordem moral, o que impede, por seu turno, possam ser susceptíveis de compensação os créditos impenhoráveis, de vez que, destruída a impenhorabilidade, seriam postos à margem todos esses motivos ou razões".

 

Na espécie, a rigor, a defesa da integralidade da remuneração, que induz à sua impenhorabilidade, repousa no princípio de ordem natural à sobrevivência, que transcende à pessoa do servidor, como observa, argutamente, Paulo de Matos Ferreira Diniz (16). O estipêndio, assim, perfigura um crédito que tem uma finalidade natural. E, quanto a tais créditos, ensina-nos Kohler, que, "se um crédito não deve ser desviado de seus fins naturais, não é permitido extingui-lo por um crédito de compensação: por conseqüência, um crédito principal só pode ser satisfeito pelo embolso do crédito de compensação, se não tiver, em virtude de sua origem, uma determinada finalidade, que se opõe a este modo de satisfação" (17). Mas a simples circunstância de exibir-se a Administração como credor recíproco não dissolve o fundamento da impenhorabilidade da remuneração do servidor. Em nada desnatura o caráter alimentar do estipêndio (18). Ante o reforça, haja vista a sua qualidade de empregador (lato senso). Tem-se, portanto, que resulta intocada a intangiblidade dos vencimentos outorgada pela lei processual civil.

 

IV. LIMITES CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS AO DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO, PARA RESSARCIMENTO E REPOSIÇÃO AO ERÁRIO ESTADUAL.

Portanto, descabe à lei estadual constranger a Administração a operar, direta e unilateralmente, a compensação de dívidas (19). A uma, porque, em assim agindo, estaria a invadir a competência legiferante da União, a quem toca dispor, privativamente, sobre Direito Civil e Direito processual Civil. A duas, por não se compensarem, nos termos da lei civil, bens e valores impenhoráveis. E, em sendo impenhoráveis os estipêndios, "ex vi" da Lei Adjetiva Comum, não se apresentaria logicamente possível – sem violência a princípios constitucionais, que garantem a existência digna, a remuneração, a irredutibilidade (mesmo que temporária) de vencimentos e o contraditório antecedente ao despojamento de bens e direitos – não se apresentaria logicamente possível, dizíamos, o desconto automático em folha de pagamento, ainda que credora a Administração. Neste caso, conquanto existente o débito (Schuld), da garantia (Haftung) acham-se excluídos os vencimentos. E, como estes não podem assegurar o débito, não admitem sejam, naturalmente, compensados ou executados.

Donde segue que, se a lei estadual já prevê o desconto parcelado – a exemplo do que sucede com o Estatuto baiano -, a Administração, para operar a compensação, haverá de se valer, necessária e preliminarmente, de autorização do servidor, após regular processo de liqüidação – se for o caso (20) -, onde assegurado plenamente o contraditório. Qualquer regra que estipule o desconto parcelado haverá de ser interpretada em prol do servidor. Em lançando mão, após autorizada, do desconto, a Administração não poderá fazê-lo além do percentual máximo ordinariamente explicitado nos estatutos (21), e dos termos em que acordado com o servidor (22), respeitada, em todo caso, a garantia de que a subsistência do devedor, e de sua família, estará resguardada (23). Inexistindo a aquiescência do devedor, valer-se-á dos meios judiciais adequados à cobrança da dívida.

De lege ferenda, a lei estadual poderá autorizar os agentes públicos a proceder aos descontos parcelados, desde que ressalve o consentimento do servidor, bem assim o não comprometimento da sobrevivência do devedor e dos que dele ex vi legis dependam.

 

V. CONCLUSÕES

De todo o exposto, conclui-se:

Na exigibilidade de crédito, oponível ao servidor, por motivo de pagamento indevido ou ato ilícito, a Administração estadual não intervém na qualidade de poder soberano, submetendo-se ao direito comum.

Conforme positiva o Direito Civil - que rege a matéria - impede a compensação os bens e valores impenhoráveis. Os vencimentos dos servidores, em sendo impenhoráveis, dado o seu caráter alimentar, não podem ser compensados.

Falece à lei estadual conferir à Administração o poder de operar a compensação dessas dívidas, sob pena de, ao abrir exceção quanto aos vencimentos de seus servidores - tornando-os tangíveis em face da ordem local - invadir a competência reservada à União, em matéria de Direito Processual Civil (impenhorabilidade dos vencimentos) e Civil (incompensabilidade dos créditos impenhoráveis).

Os princípios constitucionais que garantem o direito à existência digna, à remuneração irredutível e ao contraditório para o despojamento de bens e direitos estariam malferidos se a lei local admitisse a compensação automática daqueles débitos.

Descabe ao legislador estadual atribuir, à Administração, o poder-dever de proceder, direta e unilateralmente, ao desconto parcelado em folha de pagamento, para o fim de reposição e indenização do erário.

Pode, porém, prever essa modalidade de satisfação de dívidas, se condicioná-la à prévia concordância do servidor, respeitado o limite que a lei local costuma assinalar, ressalvada, em todo caso, a garantia de que o desconto não comprometerá a subsistência do devedor e de seus dependentes.

 

BIBLIOGRAFIA

DINAMARCO, Cândido R. Impenhorabilidade de Vencimentos e Descontos Feitos pela Administração. In: RT 543/16. 1981.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 2ª ed. São Paulo, Saraiva, 1985. v. II.

DINIZ, Paulo de Matos Ferreira. Regime Jurídico Único.3ª ed., Brasília Jurídica, 1996.

GARCÍA MÁYÑEZ, Eduardo. Introducción al Estudio del Derecho. Cidade do México, Editorial Porrua. 1978.

GONÇALVES, Luiz da Cunha. Tratado de Direito Civil. 2ª ed. São Paulo, Max Limonad. 1955. v. V, t. I.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 15ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais. 1990.

SANTOS, J. M. de Carvalho. In: Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro. Rio de Janeiro, Borsoi. v. X.

SORIANO DE SOUZA, José Paulo. O Regime Jurídico dos Servidores Municipais e a Competência Legislativa. Jurídica – Administração Municipal, ano I, nº 4, p. 30. 1996.

TORNAGHI, Hélio. Instituição de Processo Penal. 2ª edição. São Paulo, Saraiva, 1977. v. I.

 

 

NOTAS

(1) "Instituições de Processo Penal", 2ª edição, página 333.

(2) Maria Helena Diniz, com apoio em Antunes Varela, in "Curso de Direito Civil Brasileiro" 2º vol., página 28.

(3) "O Regime Jurídico dos Servidores Municipais e a Competência Legislativa", in "Revista Jurídica- Administração Municipal", ano 1, nº 4, página 30.

(4) O alcance também pode conduzir à reposição. Conquanto o alcance seja tipicamente de cunho administrativo, a impenhorabilidade dos vencimentos impede, igualmente, como se verá, o desconto inautorizado pelo servidor.

(5) "Direito Administrativo Brasileiro", 15ª edição, página 412.

(6) Lei nº 6.677, de 27 de setembro de 1994

(7) Introcucción al Estudo del Derecho, 1978, páginas 134 e 135.

(8) Embora constitua dever do servidor quitar as dívidas para com a Administração, contraídas em razão cargo, ou a pretexto de exercê-lo, interessa ao Direito Administrativo, enquanto tal, agravar o agente inadimplente, através da imposição de sanções tipicamente administrativas, próprias do poder disciplinar, em prol da incolumidade do serviço e da preservação de certos valores inarredáveis da função administrativa, como, v.g., a hierarquia. Ao Direito Civil, ao revés, cumpre dispor sobre as prestações de cunho patrimonial, e a recomposição do patrimônio afetado, em razão do descumprimento de certos deveres de natureza obrigacional. Interessa, pois, ao Direito Civil, que se radica na eqüidade, a reparação do dano patrimonial, e, por isso, a responsabilidade, por ele fixada, se transmite aos sucessores do servidor moroso ou inadimplente. Note-se que a responsabilidade administrativa do servidor, de sua feita, é sempre pessoal e intransmissível. Tal responsabilidade é imposta, sempre, tendo em vista a regularidade do serviço, situando-se, dessarte, no campo interno da Administração.

(9) A rigor, apenas explica - mas não justifica - a consignação em folha, a óbvia facilidade de que se vale a Administração para lograr a repetição ou o ressarcimento. Quer no caso de repetição, quer na hipótese de ressarcimento, o que a Administração detém, em face do servidor, é um crédito. A exigibilidade e a satisfação de tal crédito, porém, devem circunscrever-se às regras ordinárias de cobrança, quando o regime legal, atento a certos princípios que devem ser preservados – qual a tutela do direito à sobrevivência do indivíduo, seja ele, ou não servidor público - torna o débito do servidor insusceptível de compensação.

(10) In verbis, respectivamente:

"Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

.........OMISSIS.................................................................."

"Art. 964. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir.

.........OMISSIS.................................................................".

(11) "Art. 1.015. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto:

.........OMISSIS.................................................................

III- se uma for de coisa insuscetível de penhora".

(12) In "Tratado de Direito Civil", 2ª edição, vol. V. tomo I, página. 16.

(13) "Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

..........OMISSIS................................................................

IV- os vencimentos dos magistrados, dos professores e dos funcionários públicos, o soldo e os salários, salvo para pagamento de prestação alimentícia".

(14) Em notas ao "Tratado" de Cunha Gonçalves, citado, página 44.

(15) In "Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro", verbete "Compensação", página 67.

(16) In "Regime Jurídico Único", 3ª edição, página 115.

(17) Apud Carvalho Santos, obra e locais citados, que remete a Soriano Neto, "Da Compensação", nº 45.

(18) Ao cuidar dos alimentos como insusceptíveis de compensação (uma das hipótese do inciso II do art. 1.015 do Código Civil), já anotava Carvalho Santos, na obra citada, pág. 68, que "é preciso ampliar a exceção (à compensabilidade dos débitos) de forma a abranger não somente as dívidas alimentares propriamente ditas, mas também todas as outras que apresentam caráter alimentar".

(19) a) À conclusão semelhante, mas sem indicar-lhe as razões e os fundamentos, chegou o saudoso Hely (obra e local citados): "Esse procedimento (de desconto em folha de pagamento, para o fim de ressarcimento ao erário) é válido (....), mas, em qualquer caso, é necessária a concordância do responsável, porque a Administração não pode lançar mãos dos bens de seus servidores, nem gravar unilateralmente seus vencimentos para ressarcir-se de eventuais prejuízos. Faltando-lhe essa aquiescência, deverá recorrer às vias judiciais, quer propondo ação de indenização contra o servidor, quer executando a sentença condenatória do juízo criminal ou a certidão da dívida ativa (no caso de alcance e reposições de recebimentos indevidos)".

b) Este trabalho já estava concluído quando chegou-nos à mão excelente artigo – "Impenhorabilidade de Vencimentos e Descontos Feitos pela Administração" (RT 547/16) – do consagrado processualista Cândido Dinamarco. Dada a importância daquele trabalho, que aborda o assunto, cabem, aqui, em poucas linhas, alguns adendos. Chega o Prof. Dinamarco, igualmente – contudo privilegiando o aspecto processual do problema, o que certamente não o fez cogitar do instituto da compensação -, à conclusão de que os descontos previstos em lei estatutária dependem da prévia concordância do servidor. Divergimos do ilustre jurista, porém, em alguns pontos. Dinamarco parece situar a responsabilidade patrimonial do servidor não no campo do Direito Privado, mas nos lindes do Direto Administrativo. Para o insigne processualista, fundamentaria o desconto automático – se legítimo fosse -, o princípio da auto-executoriedade. Esse princípio, porém, sofreria, no Direito brasileiro Positivo, as restrições decorrentes dos chamados "limites políticos da execução", no caso a impenhorabilidade de vencimentos. Contudo, a responsabilidade patrimonial do servidor, em face à Administração, rege-se pelo Direito Privado, como já vimos. Ademais, não há que se falar em auto-executoriedade quando inexiste interesse coletivo tal justificar uma custódia recrudescida. De toda forma, parece-nos incensurável a lição do preclaro processualista quando, com rigor de raciocínio, afirma que a imposição do desconto importaria autotutela não autorizada: "se não pode a Administração obter a penhora total nem parcial do vencimento (CPC, art. 649, IV), vedado lhe é também, a fortiori, impor a unilateralmente a separação de parte do mesmo para a sua satisfação". E acrescenta que seria imperdoável contra-senso impedir a expropriação por ato de autoridade judiciária, para, depois, permitir que o bem viesse a ser arrebatado unilateralmente pelo próprio interessado, sem qualquer pronunciamento jurisdicional prévio e imparcial.

(20) E quase sempre o é, em caso de dano, o que gera, também ordinariamente, discussão quanto ao valor do ressarcimento.

(21) O percentual máximo, quando existente, será reputado como limite intransponível, em desfavor da Administração.

(22) Tem-se a formação, portanto, de negócio jurídico bilateral, que poderá dispor sobre o valor do desconto, o prazo de pagamento, a base de incidência etc.

(23) Se o servidor percebe o mínimo legal, não haverá possibilidade de desconto parcelado, ainda que anua para com a consignação. Releva, aqui, o interesse maior, de cunho social, consistente na conservação do indivíduo e de seus dependentes.

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